domingo, 8 de dezembro de 2013

Família, sociedade e o desenvolvimento emocional do ser humano



                 A questão do ambiente provedor é um tema fundamental na teoria do amadurecimento pessoal desenvolvida pelo psicanalista inglês Donald Woods Winnicott. Para o autor, a família deve proporcionar um ambiente seguro e confiável, com boas condições para o crescimento emocional, bem como proporcionar ao adolescente um espaço para a manifestação da esperança. Winnicott enfatiza na sua obra a importância do meio ambiente facilitador que permitirá o crescimento emocional saudável do ser humano.

Se a família está indisponível para ser usada, justifica-se a existência de unidades sociais para conter o processo de crescimento do adolescente, uma vez que as pessoas necessitam de um espaço na sociedade que garanta sua saúde e realização pessoal . Nesse processo a sociedade exerce um papel fundamental.

Winnicott ressalta a importância das condições ambientais para a constituição da identidade unitária, incluída aí a capacidade de relacionar-se com o mundo e com os objetos externos e de estabelecer relacionamentos interpessoais. As falhas ambientais podem comprometer a autonomia e desenvolvimento do indivíduo atingindo sua capacidade de inserir-se na cultura e no meio social.

O autor preocupa-se com o ambiente suficientemente bom e estável que permita à criança e ao adolescente o viver criativo e humano. Winnicott foca nos seus escritos, sobretudo, as relações inter-humanas.

A psicanálise winnicottiana e a Doutrina da Proteção Integral convergem no que se refere à análise das dinâmicas, humana, social e institucional. Para o autor, mediante os cuidados e um ambiente estável familiar, o ser humano pode conquistar, com saúde, seu amadurecimento emocional e o viver criativo. A Doutrina da Proteção Integral reconhece como direito absoluto das crianças e adolescentes, o acesso às políticas sociais básicas, a responsabilização da família e do Estado para garantir o desenvolvimento saudável do indivíduo.

O estado de desamparo psíquico vivenciado pelo bebê frente à angústia da perda da mãe pode ser similar àquele vivido pelas crianças e adolescentes que não tem assegurado seus direitos fundamentais e não são reconhecidos pela sociedade. Compreende-se que a falha no ambiente familiar, a perda vivenciada pela criança no estágio da dependência relativa e o não asseguramento da sua identidade como ser reconhecido socialmente, devido a falhas no asseguramento dos direitos fundamentais de acordo com a Doutrina da Proteção Integral, pode levar crianças e adolescentes às práticas delituosas.

Compreender o adolescente como sujeito de direitos vem ao encontro do que escreve Clare Winnicott ao destacar o enunciado de Winnicott acerca da importância do respeito aos direitos humanos na atenção integral ao jovem com tendência antissocial:

 
Hoje, como sempre, a questão prática é como manter um ambiente que seja suficientemente humano, e suficientemente forte, para conter os que prestam assistência aos destituídos e delinquentes que necessitam desesperadamente de cuidados e pertencimento, mas fazem o possível para destruí-los quando o encontram. (1983, p. XVI)

Referências Bibliográficas:

BRASIL. Lei Federal 8.069 de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente. Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente. Brasília-DF, 1990.

BRASIL. Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária. Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Brasília-DF: Conanda, 2006.

BRASIL. Lei Federal 12.59 de 18/01/2012. Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo – SINASE/Secretaria Especial dos Direitos Humanos – Brasília/ DF. CONANDA. 2012.

ROCCO, C. Contribuições da Teoria do Amadurecimento de D. W. Winnicott para o Atendimento Socioeducativo ao Adolescente Privado de Liberdade. PUC/SP, 2010. Dissertação (Mestrado em Psicologia Clínica) – PUC-SP, 2010.

WINNICOTT, C. [1967]. Introdução. In: WINNICOTT, D. W. [1989]. Privação e delinqüência. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

WINNICOTT, D. W. Tudo começa em casa. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
_____. Privação e Delinquência. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
_____. Natureza Humana. Trad. Davy Bogomoleletz. Rio de Janeiro: Imago, 1990.

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Reticências...


A dinâmica interna de cada ser humano é determinante da forma como atuamos no mundo, no nosso contato com a realidade e nas relações que estabelecemos.
 

O que nos torna únicos são as nossas reações emocionais frente às situações que vivenciamos, nossas relações de trabalho, família, relacionamento conjugal, vínculos amorosos.  

 
Considerando as experiências que fazemos de nós mesmos, a repentina emergência de coisas novas e inusitadas podem provocar certo desconforto e insegurança. Ousar é difícil. Uma trajetória de vida marcada por alicerces morais rígidos exige a superação contínua de nossos próprios pré/conceitos engessados para estruturarmos outra maneira de viver, mais livre e aberta ao novo.
 

Nossas mudanças de atitude estão ligadas ao estranhamento do nosso viver. Estranhar significa parar, pensar, descontruir, romper para depois construir e ressignificar, uma dinâmica saudável da existência. Não dá para tentar nomear emoções, olhares, toques, sensações. O essencial é se permitir viver profundamente tudo isso.   Viver momentos felizes, mesmo que fugazes, é a tradução da felicidade.

domingo, 1 de dezembro de 2013

Momento Depressivo


Esse momento marca o nascimento do afeto depressivo. É um momento em que a crosta isolante que nos deixa num mundo a parte começa, aos pouquinhos, a se romper. Aí se inicia o processo de ressignificação da nossa existência.

 
Observamos o despertar de um olhar interno. Podemos pensar numa rica diversidade de sentimentos e emoções, ao mesmo tempo tão simples, óbvios e humanos. Talvez uma experiência de des/reconstrução interna de cada um de nós, ao mesmo tempo que entramos em contato com a própria impotência da nossa existência.
 

Este momento é caracterizado por uma depressividade que pode ser compreendida como protetora e reguladora do psiquismo. Na liberdade do próprio ritmo de pensamento e expressão, podemos ampliar nossa capacidade de pensar sobre os fantasmas que constituem a vida interior, o que pode possibilitar a superação de uma condição alienante das questões éticos-humanas.

 
A sociedade moderna, as crises institucionais e massificação das pessoas interfere no pensar e no viver criativo. A esse respeito, Vasconcellos (apud Levisky, 2000, p. 139) escreve:

 
Em função do bombardeio de estímulos e do aumento da tecnologia que favorece a satisfação imediata dos desejos em um mundo movido a botões, que permite a realização mágica dos desejos, estamos perdendo o senso crítico, a capacidade de pensar a realidade e nos mantemos em situação de passividade (...) O homem (...) em vez de pensar, é pensado, programado, conduzido a atuar, consumir. Isso impede a sua criatividade, sua capacidade de refletir, pensar, construir, transformar e evoluir.  
 

O momento depressivo, não é patológico. É determinante para a mudança em que o mundo interno se reorganiza num movimento criativo. É só através das relações inter-humanas que ocorre essa vivência, a introdução de um novo tempo – tempo de viver e construir.

 
Referências Bibliográficas:

 
LEVISKY, D. L. (Org.) Adolescência: pelos caminhos da violência. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1998.

ROCCO, C. Um estudo psicanalítico do Momento Depressivo da adolescente privada de liberdade. Monografia de Conclusão do Curso de Especialização em Psicologia Clínica. São Paulo: COGEAE/PUC, 2004.

sábado, 30 de novembro de 2013

COTIDIANO


 
 
 
 
Considerando a correria do dia a dia, principalmente numa grande cidade, como estabelecer relações afetivas ricas e saudáveis? Como cuidar de mim? Como viver de forma saudável?

 

O ser humano é um ser faltante. Cada um de nós traz um vazio que nos impulsiona a procurar o outro, tanto para um relacionamento amoroso quanto uma amizade saudável. O outro faz com que a gente vivencie experiências gratificantes ou nos trazem sofrimento e sensação de perda. Mas, isso faz parte da vida, dos amores e dissabores.

 

A rotina, a correria, os sobressaltos, assaltos, o medo, o cansaço, as contas a pagar, o trânsito, metrô ou ônibus abarrotados, engolem nossa capacidade e ânimo de sorrir mais, dar um abraço amigo, contar uma história para os filhos antes de dormir, sair com amigos ou fazer amor.

 

As fisionomias dos passageiros no metrô ou na fila do ônibus revelam a fotografia do esgotamento. Cansaço, tristeza, mãos calejadas, a luta por um espaço no metrô, a luta por um reconhecimento social que dê maior dignidade ao dia a dia.  

 

A intimidade o cuidado com o próprio eu, algo tão essencial para cada um, no meio de tantos compromissos, responsabilidades, pessoas, correria e desgaste, se perde, se esvai como água deixando nossa mente desidratada. Essa desidratação mental leva ao adoecimento do corpo e da mente. E lá vêm as enxaquecas, gastrites, dermatites, depressões, ansiedade, dentre tantas outras. Ser engolido pelo cotidiano impede  um viver prazeroso e criativo.

 

O que fazer para mudar tudo isso? A primeira providência é simplesmente parar. Tire um dia para você. Vá a um lugar tranquilo e repense sobre sua vida. Quais são as suas prioridades? Que espaço do dia você reserva para elas? Telefona para os amigos, família?

 

Pequenas mudanças podem fazer a diferença, acordar mais cedo, por exemplo,  caminhar, ter um tempo maior para tomar café com calma, se maquiar e usar uma roupa bonita para ir trabalhar. A feminilidade desperta, o gostar mais de si aflora com um terno bacana ou um vestido diferente. Sair para a loucura cotidiana, colocar os pés nos degraus que levam a um mundo onde o lema, cada um por si predomina, fica mais fácil.

 Aos poucos, você encontra novas formas de realizar pequenas (nem por isso menos importantes) mudanças no cotidiano que possibilitam olhar o mundo de forma diferenciada e qualificam a vida.

 

segunda-feira, 28 de outubro de 2013

JOHN BOWLBY E D. W.WINNICOTTT: UMA REFLEXÃO


  
ESTUDO SOBRE JOHN BOWLBY

                        A Comissão Social das Nações Unidas foi realizada no mês de abril de 1948 e considerou importante um estudo sobre as necessidades das crianças sem lar. [1] A ONU pediu sugestões e a Organização Mundial de Saúde, na qualidade de organização especializada, propondo a exploração de problemas relativos à doença mental. Para tanto, convidaram Dr. Bowlby, que iniciou sua pesquisa em janeiro de 1950 concluindo-a com um relatório – Maternal Care and Mental Health[2] publicado em 1951. Nestes escritos Bowlby considerou a necessidade das crianças em se garantir assistência e afeto para um desenvolvimento saudável, ou seja, enfatizou a importância dos cuidados parentais nos primeiros anos de vida da criança, para sua saúde mental.

                        Para ele, é “essencial [...] que o bebê e a criança pequena tenham a vivência de uma relação calorosa, íntima e contínua com a mãe (ou mãe substituta permanente [...]) na qual ambos encontrem satisfação e prazer” (BOWLBY 1995 [1952], p. 13). Então, o “estar” numa relação compensadora com a mãe, pai e irmãos é a “base do desenvolvimento da personalidade e saúde mental” (idem, p. 14).

                        Bowlby (1995 [1952]) denominou privação da mãe quando mãe-criança não estabeleciam um laço amoroso e a primeira não prestava os cuidados apropriados, mas, considerou a complexidade e algumas variações do termo dependendo da intensidade da privação - falta parcial ou quase total - de posterior cuidado amoroso:
 
  • Privação da mãe - casos em que a mãe (ou sua substituta) não estabelece esta relação amorosa com a criança;
  • Privação parcial – caso em que, por alguma razão, a criança é afastada dos cuidados maternos, sofre uma privação relativamente suave, mas, alguém substitui a mãe sendo, no entanto, uma pessoa conhecida pela criança e por ela considerada confiável;   
  • Privação acentuada – quando a mãe substituta é estranha à criança, mesmo sendo uma pessoa amorosa (para o autor, esta relação traz uma satisfação para a criança representando, assim, uma privação parcial);
  • Privação quase total – comum em instituições, creches residenciais e hospitais, a criança, neste caso, não tem especificamente uma única pessoa (com a qual sinta segurança) que preste um cuidado pessoal.

                   Bowlby (1993), realizando uma análise das suas observações com crianças pequenas - entre doze meses e três anos de idade - a reação à separação da mãe, no caso da criança ser colocada com estranhos num lugar desconhecido, seria, inicialmente de protesto (esforço para recuperar a mãe). Posteriormente surge o desespero, o anseio pela volta da mãe, mas a esperança diminui. Finalmente, cessam as exigências a criança torna-se apática e retraída, com um lamento monótono.

                        Com relação às crianças filhas de mães solteiras, após relatar diversas pesquisas e trabalhos, Bowlby enfatiza a necessidade de um estudo sobre o assunto, mas adverte que às vezes é inviável propiciar assistência  para a mãe possibilitando recursos que a levem a se responsabilizar pela criança fornecendo efetivos cuidados maternos; desta forma, a seu ver, a adoção seria a medida mais favorável.      Entretanto, Bowlby enfatiza que quanto mais nova for a criança mais favorável será sua identificação com as figuras parentais e formação de vínculos.

                        O autor (1993), apesar de reconhecer que seu referencial teórico foi a psicanálise [3], admite que seus estudos apresentam divergências da teoria freudiana como também dos seus seguidores. Bowlby recorreu à etologia e à teoria do controle para desenvolver seus estudos sobre as defesas e trabalhos sobre a psicologia cognitiva e o processamento da informação humana. Em 1961, tentando compreender a natureza do luto [4], voltou sua atenção para as idéias de Darwin.

                        Bowlby (1993) considerou seus estudos e pesquisas como “um novo paradigma para a compreensão do desenvolvimento e da psicologia da personalidade” (idem, XVIII).

                        Percebe-se que o objetivo de Bowlby está focado na descrição de certos padrões de reação da personalidade que ocorrem na primeira infância para mensurar padrões de reação identificados no funcionamento posterior da personalidade.  Priorizou os dados obtidos de estudos prospectivos relacionando os “grupos de dados” delineando, desta forma, os tipos de teoria que seus estudos deram origem.
 

D.W. WINNICOTT  E JOHN BOWLBY

 
                        Em 1953 Winnicott escreveu uma resenha de Maternal Care and Mental Health, nesta, o autor mobiliza sua própria teoria para discutir com Bowlby[5].

                        Neste artigo (1994 [1953] p. 323), Winnicott considera uma “contribuição especial de Bowlby” quando descreve os efeitos da privação materna e a importância dos primeiros cuidados para a saúde mental do bebê. Porém, critica o uso de estatística para discutir as questões psicológicas, como ainda discorda da utilização que Bowlby faz de terminologia oriunda da psicanálise tradicional tal como a comparação do ego à uma maquinaria psíquica.

                        Na resenha de 1953 e posteriormente, num artigo escrito em 1961, Winnicott concorda com Bowlby quando este enfatiza que “a privação leva ao estabelecimento de uma tendência anti-social” (p. 55), mas ressalva que as descobertas de Goldfard não conduzem a uma resposta teórica para a questão da tendência anti-social. Adverte que leitores desavisados podem associar que a etiologia do comportamento anti-social estaria na dificuldade para pensar. Este ponto de vista é inadmissível para Winnicott: como atribuir o problema do ambiente ao ambiente ao pensamento

                        É compreensível que a visão de um autor como D. W. Winnicott que entendia por sua tarefa o estudo da natureza humana, divergisse substancialmente das idéias apresentadas por Bowlby, para ele existem fatores internos muito complexos que Bowlby não alcança com sua pesquisa embora Winnicott reconheça a importância da ponderação em que o papel da mãe (ou substituta) é crucial para o desenvolvimento saudável do ser humano.  

                        Para Winnicott a natureza humana começa já na concepção do bebê com seus pais tendo envolvimento e responsabilidade pelo resultado do seu ato. Como diz o autor em Natureza Humana (1990, p. 47).

 
A data do nascimento é obviamente notável, mas até ali muita coisa já aconteceu especialmente com a criança pós-madura, e ao nascer já existe uma individualidade tão marcante, [...] Ao fim de duas semanas, todo bebê já passou por inúmeras experiências inteiramente pessoais. Na idade em que uma adoção se torna relativamente fácil de ser realizada, o bebê já está tão marcado por experiências reais que os pais adotivos têm problemas de manejo essencialmente diferentes daqueles que teriam se o bebê fosse deles mesmos e estivesse com eles desde o início.

 
                        Tal formulação contrapõe-se à de Bowlby uma vez que este desconsidera o período anterior ao nascimento do bebê. Winnicott valoriza as experiências ocorridas na vida intra-uterina, além do apoio que a mãe teve durante a gestação, suas fantasias sobre o bebê e seu envolvimento e aceitação da gestação.

                        Muitas vezes Winnicott foi considerado um teórico otimista, mas concordamos com a sua visão que, no nosso entendimento, não é ingenuamente otimista, é fundamentada nos seus longos anos de estudo e clínica. Além disso, é difícil desconsiderar que apesar do fracasso da provisão ambiental o bebê pode, em posterior circunstância favorável vitalmente importante, experenciando relações objetais positivas, retomar seu processo de amadurecimento.   

    
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS     

Bowlby, John. Cuidados Maternos e Saúde Mental. São Paulo, Martins Fontes, 1995.

_____. Perda: Tristeza e Depressão. Volume três da Trilogia Apego e Perda. São Paulo, Martins Fontes, 1993.

Winnicott, Donald W. Explorações Psicanalíticas. Porto Alegre, Artes Médicas, 1994.

____.Natureza Humana. Rio de Janeiro, Imago, 1990.

 

 

 

 

 

 

 

 

                       

                       

 

 

 

 

     



[1] Entendeu-se por “crianças sem lar” as órfãs, as separadas de suas famílias e colocadas em lares substitutos e\ou instituições (BOWLBY 1995 [1952] Prefácio da primeira edição).
[2] Cuidados Maternos e Saúde Mental, o livro baseou-se neste relatório e foi publicado em 1952.
[3] Na resenha sobre Cuidados Maternos e Saúde Mental, escrita por Winnicott em 1953, este  ressalta que, apesar de Bowlby citar a psicanálise, Freud não consta na sua bibliografia.
[4] Estudo que resultou no volume três da trilogia Apego e Perda, “Perda: Tristeza e Depressão”, obra que explora, entre outras coisas,  as diferentes maneiras pelas quais as crianças pequenas reagem a uma perda, permanente ou temporária, da mãe considerando as implicações desta perda para a psicopatologia da personalidade. 
[5] Considerações do Prof. Dr. Zeljko Loparic em aula ministrada no dia 14.09.2007.

domingo, 27 de outubro de 2013

Adolescente: vítima e vitimizador







Tecer considerações sobre a prática de um delito pelo adolescente é uma tarefa complexa, tentaremos compreender alguns aspectos deste problema de grande proporção e comoção social.

 

Apesar de atravessar todas as classes sociais e estar presente em países ricos e pobres, pesquisas internacionais demonstram que o fenômeno da violência no adolescente “está associado à desigualdade social, ao modo como a sociedade trata a sua juventude (Teixeira, apud Levisky, 2001, p. 210).

 Evidencia-se que os índices de pobreza e miséria de grande parte da população brasileira e o descaso ao cumprimento dos direitos fundamentais do ser humano contribuem significativamente para que os adolescentes, sem acesso aos recursos sociais, enveredem pelos caminhos da marginalidade. (Souza, apud Levisky, 2001).

O “ter” estimulado por uma sociedade em que o consumo impera como uma valoração narcísica, aparece como uma via de “ser”; o ato se sobrepõe ao pensar; a expressão da destrutividade e da violência tornam-se uma forma encontrada pelos adolescentes de “sobreviverem” enquanto sujeitos massificados pelo descaso social.


É relevante pensar que a diferença na posição social do sujeito influencia, significativamente, a estruturação de sua adolescência. As desigualdades sociais se refletem e dificultam o processo da adolescência do jovem de classe menos favorecida, pois ele se ocupa de questões básicas de sobrevivência, fator impeditivo do surgimento e elaboração do conflito inerente a essa etapa do desenvolvimento.

Nestas circunstâncias, os jovens ficam à deriva, à mercê da própria sorte e não há como se desenvolver o sentido da própria identidade e se estruturar a personalidade do adolescente. Ou melhor, não há espaço para sua construção enquanto sujeitos, se o mínimo de afeto, educação, saúde e respeito não é garantido e se o adolescente internaliza significados identificados com o campo da exclusão social.

Zimerman (in Levisky, 2001) analisa as profundas causas etiopatogênicas responsáveis pela eclosão da violência no adolescente enfatizando o papel do grupo familiar:

A violência dentro da ´família’, situação nada incomum, em que pais maltratam filhos por meio de privações essenciais, abandonos ou verdadeiras e cruéis agressões físicas. Nesses casos, a conseqüência mais grave talvez consista no modelo de identificação de atitudes violentas que vai passando de geração à geração.

 

Nesse contexto de sofrimento, o adolescente sai de casa, fugindo das situações de riscos intrafamiliares. Essa saída é uma possibilidade de romper com o processo de coisificação imposto pela violência familiar, de retomar o poder sobre si e de se tornar sujeito de sua própria história. Entretanto, o adolescente encontra nas estruturas urbanas e no grupo marginal do qual se aproxima outras situações de riscos e isolamento que comprometem seu desenvolvimento mas, que são vistas por ele como a única possibilidade de inclusão, de pertença.

Calil (apud Ozella, 2003) ressalta:

 Vivendo nas ruas, em constante perigo, imersos no mundo da exclusão, do não ser, construindo relações que fogem aos parâmetros de socialização considerados adequados pela sociedade, crianças e adolescentes assumem o significado de marginais, delinqüentes e desumanos que a sociedade lhes atribui (p. 147).

O grupo, ao se perceber distante dos ideais sociais, constituem, entre si, um campo identificatório em potencial por sua condição marginal, o que pode favorecer a emergência de um confronto social mediado por impulsos destrutivos. Teixeira (apud Cohen, 1996) escreve que a interdição da destrutividade se coloca como exigência social, organizadora da possibilidade de vivermos em coletividade, ressaltando que essa seria a única maneira de sobrevivência. A agressividade não encontrando o recalque ou as vias da expressão simbólica, vai atingir o próprio sujeito ou ser descarregada diretamente contra o mundo exterior.

No caso do adolescente que comete um delito o pai simbólico está ausente, pois, no seu desenvolvimento infantil ocorreram muitas perturbações e falhas ambientais que prejudicaram o desenvolvimento das funções de interdição e de ideal . Para Goldenberg (apud Levisky, 1998), o poder judiciário, representado pelo juiz passa a exercer a função paterna no inconsciente desse adolescente. O adolescente transgride a fim de estabelecer um controle externo que limitem seus impulsos.

Levisky (1998) introduz comentários feitos por Renato Mezan durante o II encontro Adolescência e Violência: Conseqüências da Realidade Brasileira. Mezan sinaliza que a coerção é desejada pelos adolescentes, ao menos numa certa intensidade que seja “suficiente para impedir o desregramento, mas não tão implacável a ponto de se tornar mutiladora”. Prossegue dizendo que “este elemento está relacionado à função educadora da frustração, dimensão que parece se opor à idéia de felicidade como estado de gozo sem conflitos”(p.37).

O valor assegurador do apoio parental (ou seu substituto) durante a adolescência, não pode ser subestimado. O adolescente necessita da confiabilidade, do acolhimento sobre o qual seja possível escorar-se, de um ser humano que possa agredir, sem destruir. Nesse sentido, toda autonomia concedida, precocemente, aos adolescentes é violência à sua vida psíquica pois nega a necessidade que eles possuem de um adulto que esteja presente assegurando o seu crescimento saudável.

A grande maioria dos adolescentes que cometem atos infracionais, originam-se de famílias nas quais a maternagem e a função paterna inexistem ou são deficitárias, independente da situação sócio econômica. Portanto, compreendo que muito do que é escrito sobre o processo adolescente atende apenas parcialmente a descrever essa dura realidade. Afinal, não se trata apenas de transgredir como uma maneira de se fazer notar no mundo adulto, a transgressão caminha paralelamente à falta da internalização da lei e à adesão ao grupo marginal como sendo a única possibilidade, a tábua de salvação do eu que ia mais ou menos se afogando no vazio narcísico de não ser visto pelo outro.

 

Cláudia Rocco

domingo, 20 de outubro de 2013

Sábado à tarde num Pronto Socorro


Hoje, terminando o domingo, compartilho a experiência de uma tarde interessante...

Bom, chega uma hora que não dá mais para adiar.

Tarde de sábado... um sol lindo ... Eu, já com dois casacos, decido que é o momento para ir ao Pronto Socorro. Chego lá... as mesmas burocracias.. Mas, para minha surpresa estava muito vazio, adorei.

Acho que foi por isso que tive a oportunidade de fazer o que mais gosto e que tem a ver com a profissão que escolhi: ouvi, acolhi, observei, cuidei.. E também fui muito bem cuidada e acolhida.

Fui encaminhada a uma sala para aguardar por três horas meu exame ficar pronto. Ao entrar, vi várias cadeiras em círculo e a
TV ligada no programa do Caldeirão. Sala vazia.

Com o canto dos olhos espiei a sala ao lado onde alguns estavam confortavelmente instalados em poltronas reclináveis.. mas, estavam
no soro. Por uma fração de segundos fiquei com uma invejinha. Mas a minha sala, como descobri depois, era muito mais animada. Estava lá sozinha quando entrou um rapaz dizendo que passou mal no Pet Shop ao levar o seu cachorrinho. Deixou o dog em casa e foi ao PS mas, sentia que agora estava piorando... era o frio do ar condicionado. Já entramos num papo de ar condicionado no carro. Ele não liga o dele de jeito nenhum...eu adoro... Ele tiritava.. pedi um cobertor e disseram que ali não davam cobertor. Acho que deve ser só para o pessoal da poltrona reclinável. Bem que ele podia estar na poltrona..

Ofereci um dos meus casacos mas ele gentilmente recusou e, animadamente, continuou tremendo e conversando. Entrou uma senhora de idade com o sorriso doce e o olhar meigo, exalando compreensão. Há muito tempo eu não via um olhar assim. Ela também gostava de conversar e falamos os três de fome, espera, hospitais, trabalho, cidades...

Entrou um casal de namorados, tão apaixonados e felizes que não dava pra saber quem era o doente. O resto da sala não existia. A
paixão faz com que as pessoas fiquem autocentradas, é linda...

A senhora saiu e depois voltou toda contente porque tomou um café e comeu bolo... Eu e o rapaz do frio estávamos e continuamos com
fome. Outras pessoas entraram e saíram rapidamente mas nós já não prestávamos mais atenção. Um grupinho se formara e estávamos bem
assim. O tempo passou rápido. A espera ficou muito mais fácil. Aos poucos cada um foi saindo, primeiro o rapaz do frio, depois a
senhora do olhar meigo, por último eu deixando a sala, sem poltrona reclinável, mas que fora tão acolhedora.

Saio de lá com a certeza de que as pessoas que estão ao nosso redor é que fazem a diferença entre vivenciar momentos
tensos e dolorosos ou amenizar os momentos difíceis.

sábado, 21 de setembro de 2013

Conceito de narcisismo na obra de Freud: pequena contribuição


O termo narcisismo surgiu pela primeira vez em Freud numa nota de 1910, acrescentadas aos Três ensaios sobre a teoria da sexualidade.

Em Leonardo da Vinci e uma lembrança de sua infância e no Caso Schereber (1911), Freud também considerou o narcisismo como um estádio normal da evolução sexual.

O termo adquiriu valor de conceito em 1914, quando Freud escreveu Sobre o narcisismo: uma introdução. A partir de então, o narcisismo passa a ocupar um lugar essencial na teoria do desenvolvimento sexual (Roudinesco e Plon, 1998).

No escrito Freud observa:
A libido afastada do mundo externo é dirigida para o ego e assim dá margem a uma atitude que pode ser chamada de narcisismo

No texto de 1914, através da observação do delírio de grandeza no psicótico, Freud definiu o narcisismo como atitude resultante da retirada dos investimentos libidinais feitos nos objetos do mundo externo para o eu do sujeito. Esse movimento de retirada só pode produzir-se se precedido pelo investimento dos objetos externos por libido proveniente no eu.

A partir de 1914, a noção de narcisismo adquire estatuto conceitual no conjunto da teoria psicanalítica; mas, a distinção entre narcisismo primário e narcisismo secundário adquire contornos definidos após a elaboração da 2ª tópica freudiana.

Em Sobre o narcisismo... Freud escreve que uma unidade comparável ao eu não pode existir no sujeito desde o início, o eu tem que desenvolver-se. As pulsões auto-eróticas estão presentes desde o início, assim, algo é acrescentado ao auto-erotismo de forma a ocasionar o narcisismo. O que se acrescenta ao auto-erotismo para dar forma ao narcisismo é o eu ((Ich, no alemão).

O narcisismo é visto como um componente normal da sexualidade e o processo constituinte da subjetividade. No texto de 1914 fica clara a existência de três modos distintos e sequenciais de funcionamento libidinal:

1º Auto-erotismo - não há diferenciação entre eu e objeto.

2º Narcisismo - passagem de completa indiferenciação para a constituição do eu como unidade.

3º Escolha de objeto - a libido é investida no mundo externo.

É a partir do estudo sobre o narcisismo que este deixa de ser uma perversão e passa a ser apontado como constituinte da subjetividade.

O narcisismo, para Freud, é condição de formação do eu.

A criança passa, no começo de sua vida, por uma fase de narcisismo primário, na qual os objetos externos não são reconhecidos como tais. A energia pulsional é investida no próprio eu. Posteriormente, o bebê começa a ser capaz de perceber sua mãe como objeto que satisfaz. A relação com ela se dá, em grande parte, através do ato de mamar. A criança sai do narcisismo primário porque seu eu se vê confrontado com um ideal com o qual se compara. A criança é submetida às exigências do mundo, exigências traduzidas através da linguagem.


Referências Bibliográficas:

FREUD. S. Ensaios sobre a teoria da sexualidade (1905, v. VII). Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas (E.S.B). Rio de Janeiro: Imago, 1974.

________. Sobre o narcisismo: uma introdução (1914, v. XIV). E.S.B. Rio de Janeiro: Imago 1974.

ROUDINESCO, E. & PLON, M. Dicionário de Psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1998.

ROCCO, C. Depressão: um estudo psicanalítico. Trabalho de graduação interdisciplinar. Universidade Mackenzie, São Paulo, 1997.

________. Narcisismo. Trabalho apresentado como exigência parcial para obtenção do título de Especialista em Psicanálise no Curso de Especialização em Teoria Psicanalítica - COGEAE - PUC/SP.

domingo, 8 de setembro de 2013

Esperança e Criatividade





"O paradoxo de nossa época é que a esperança é ligada à desesperança
(...) Há princípios de esperança nas possibilidades criadoras da humanidade,
nas escolas, instituições onde as mentes dos pequenos são domesticadas ".

(Edgar Morin, 2009)

Para atingir um amadurecimento emocional que permita um viver criativo, a criança precisa ter espaço para pensar... ser estimulada a buscar suas próprias respostas para um universo de perguntas que borbulham na sua mente curiosa.

O silêncio da mente é como uma doença que impede a evolução do ser no mundo e as mudanças sociais.

A curiosidade, a inquietude é o que instiga a pesquisa, a busca pelo saber.

Domesticar a mente de uma criança impede a formação de um adulto crítico e politizado.

As instituições, ainda totais, formam indivíduos com uma mente que não pensa, reproduz modelos arcaicos de pensar o mundo.

O pensar criativo e a esperança transformam o homem ao mesmo tempo em que permitem que ele transforme o mundo.

O papel dos pais, como representantes da primeira instituição da criança - a família - é primordial para possibilitar um processo de amadurecimento emocional que permita um viver criativo e espontâneo (D. W. Winnicott).

domingo, 23 de junho de 2013

FIM DA LEI DO CÃO




Num país marcado pela violência, impunidade, amoralidade, indignidade, doenças, fome... como sobreviver?

Felizmente, a classe dita "média", não sei se todos tem essa consciência crítica mas essa
classe está cada vez mais "achatada", vendo se esvair alguns direitos já alcançados. Essa "classe" vista por alguns como privilegiada, na minha opinião é aquela minoria que teve
oportunidade de estudar, ter um emprego, é aquela que pode ir às farmácias comprar remédios, tem sua casa para morar, enfim. um mínimo de dignidade. Mas, é a mesma classe que paga muitos impostos...

Os estudantes, pessoas que tem minimamente seus direitos resolveram juntar-se às vozes que clamam por justiça e também foram às ruas... Para protestar SIM por um país melhor, para que TODOS tenham acesso aos DIREITOS BÁSICOS e sejam tratados como CIDADÃOS.

Leio, consternada, na internet pessoas que perguntam num tom de ironia...

Porque essa manifestação não aconteceu antes?

E importa? Não dá para definir o momento certo... Uma gota que fez com que o "copo" da passividade e tolerância transbordasse... O importante é que o NOSSO POVO se uniu... A Lei do Cão não cabe mais para esta gente sofrida, inclusive a dita "classe média" que trabalha cinco meses só para pagar impostos. Para onde vai esse dinheiro?

As manifestações pacíficas devem continuar. Há muita coisa para mudar. "Quem sabe faz a hora..não espera acontecer".


Afinal, MUDANÇAS SÃO REALIZADAS PELO HOMEM E PARA O HOMEM!

quarta-feira, 19 de junho de 2013

ORGULHO DE SER BRASILEIRA







Nos últimos dias vimos, a princípio com certa perplexidade, estudantes universitários, famílias, trabalhadores, senhoras donas de casa se unirem num coro único e solidário .... iniciava-se uma manifestação pelo aumento da passagem do ônibus.

Perguntei a mim mesma? É só isso? Não era....

Vivemos e convivemos num país em que a miséria é vista com naturalidade.. acesso à educação de qualidade, atendimento digno e qualificado na área da saúde (nem os Planos de Saúde particulares nos oferecem um atendimento digno!!), saneamento básico! Nossas crianças brincam no esgoto.. convivem com ratos, são invisíveis... Ônibus? Até onde vão as linhas? Até que ponto da cidade existem ruas asfaltadas? E Creches... promessas que tem que ser cumpridas... O povo hoje tem VOZ que ninguém mais vai conseguir calar... Isso é certo e, como cidadã brasileira quero acreditar que a luta vai continuar SEMPRE!

O "país do samba, do carnaval, do futebol e do Pelé" vem mostrar ao mundo que é um país que tem um povo politizado que LUTA por seus DIREITOS... DIREITOS BÁSICOS!!!

O vandalismo?

Lógico que não vem dos manifestantes... Quem fala isso quer desviar a atenção da seriedade deste
movimento que é LEGÍTIMO e PACÍFICO...

BRAVA GENTE!!!

VALEU BRASIL!!!!

sábado, 1 de junho de 2013

Meu filho adolescente.... E agora?





Ser jovem é tão antigo quanto a humanidade, mas só a partir do século XVIII é que este passou a ocupar lugar de destaque na vida social humana, apesar de já existir uma percepção desta particular fase de desenvolvimento.

A juventude era identificada como um período de características próprias com relação ao corpo, ao crescimento, ao desenvolvimento, a certos comportamentos e funções na sociedade. Juventude significava força da idade e a sua história estava relacionada à dependência. Tornar-se Independente decidia o final da infância (Ariés,1981).

Para resolver os problemas, desafios e riscos enfrentados pelos adolescentes, é necessário tratá-los como um todo. Viabilizar a criação de mecanismos e meios que levem o adolescente a conviver em ambientes que i incentivem a adquirir estilo de vidas saudáveis.

O importante, mas não podemos deixar de admitir as dificuldades, é levar o adolescente a se tornar sujeito de sua própria existência e a considerar sua comunidade, sentindo-se parte integrante dela.

Os pais biológicos ou não, muitas vezes, sentem-se impotentes frente às situações e adversidades que encontram para exercer a paternidade ou maternidade; para estarem próximos ao filho ou filha que vivenciam um momento em que precisam se distanciar da família, rebelar-se contra valores, questionar, experimentar, enfim... buscar, incessantemente, seu eu, sua identidade e lugar social.

A impotência parental impede o caminhar, as bocas emudecem e o vazio e distanciamento entre pais e filhos se impõe como algo inevitável. Isso não é verdade, as coisas podem ser diferentes e os pais precisam sair do lugar de imobilização e construir uma ponte entre eles e o adolescente.

Como construir essa ponte?

O primeiro passo seria fazer uma retrospectiva de vida, pensar ... Como foi a minha adolescência? Quais eram meus medos, angústias...? O que eu queria mudar, transformar? Como via meus pais? E as minhas experiências?

Penso que essa reflexão pode possibilitar uma visão humanizada e até mesmo levar a compreensão das dores da adolescência. Sim, porque o jovem está sofrendo com todas as mudanças e sentimentos com os quais não consegue lidar.

A ponte leva a um lugar de diálogo, escuta,compreensão e acolhimento oportunizando ao adolescente ser o protagonista da sua história. Às vezes a falta de percepção das transformações evolutivas de seus filhos torna a realidade árida e as relações empobrecidas, esse descaminho deve ser evitado.



Referência Bibliográfica:

ARIÈS, P. História Social da Criança e da Família. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 1981.

sexta-feira, 31 de maio de 2013

Pensamentos de Donald Woods Winnicott...







Por incidir seu olhar para o estágio primitivo da natureza humana, Winnicott entende o bebê como
uma organização em marcha para a conquista do SENTIMENTO DE SER.

"O sentimento de estar vivo não se deve exclusivamente ao fator constitucional ou biológico, mas a
uma conquista contínua que implica um ambiente facilitador".


(WINNICOTT, D. W. "A Criança e seu Mundo")







terça-feira, 28 de maio de 2013

DESENVOLVIMENTO DA CAPACIDADE PARA SE PREOCUPAR COM O OUTRO SER HUMANO









Estágio do Concernimento

[...] eu me preocupo muito com o desenvolvimento da capacidade de preocupação (Concern).

Winnicott (1948)


Winnicott (1963) formula sua compreensão acerca do estágio do concernimento, frisando “ser uma condição para a conquista do concernimento a passagem pelos estágios iniciais sem demasiados problemas” (Moraes, 2005, p. 220, grifo da autora).

Entendemos que é importante ressaltar esta introdução ao estudo deste estágio realizada pelo autor:

Estamos examinando a psicologia do estágio que acontece imediatamente depois do novo ser humano ter alcançado o status de unidade [...] Gostaria de deixar aqui a observação de que quanto mais recuarmos na história individual, mais verdadeira se torna a proposição segundo a qual não há sentido em falarmos sobre o indivíduo sem considerarmos um ambiente suficientemente bom que se adapte às suas necessidades (2000 [1954-5, p. 360].).

A capacidade para o concernimento resulta de um cuidado suficientemente bom e seu desenvolvimento está ligado à saúde psíquica. No desenvolvimento emocional certas condições externas são necessárias para o amadurecimento pessoal. Como Winnicott diz:

A provisão ambiental continua a ser vitalmente importante aqui, embora o lactente esteja sendo capaz de possuir uma estabilidade interna que faz parte do desenvolvimento da independência (1983 [1963], p.72).

Assim, mediante estes cuidados, o bebê alcança, em algum grau, o estatuto de um EU unitário como também já pode realizar a tarefa de integração da vida instintual. Estes seriam os pré-requisitos para a entrada no estágio do concernimento.

O bebê aqui já se percebe como uma unidade e à mãe como pessoa separada, inicia a integração da instintualidade como parte do seu eu. A criança percebe que ama e odeia o mundo fora dela e a realidade de que possui impulsos amorosos e destrutivos para com o mesmo objeto. Desta forma, se vê concernida pelo amor e pelo ódio, Winnicott é enfático ao afirmar que só a sustentação ambiental permite esta relação.

Portanto, o concernimento (Concern), considerado por Winnicott como uma experiência que demanda certo desenvolvimento emocional, surge com a integração da mãe-ambiente e mãe-objeto na mente do bebê. É neste estágio que ocorrem alterações importantes no mundo interno da criança em função do seu amadurecimento pessoal.

Para ele, o termo concernimento é utilizado para dar conta, de um modo positivo, do fenômeno que é abarcado negativamente pela palavra ‘culpa’. O concernimento implica uma maior integração e relaciona-se a um sentimento de responsabilidade, refere-se ao fato de que o indivíduo se importa ou se preocupa, aceitando a sua responsabilidade.


O autor diz que nesta fase a relação é eminentemente dual, mas, embora tente situar a época em que o momento ocorre, acredita que não existe uma precisão absoluta uma vez que o amadurecimento do ser humano acontece ao longo da vida:

Há uma boa razão para se acreditar que preocupação – com seu aspecto positivo – emerge no desenvolvimento emocional inicial da criança em um período anterior ao do clássico complexo de Édipo, que envolve um relacionamento a três pessoas, cada uma sendo percebida como uma pessoa completa pela criança. Mas não há necessidade de ser preciso sobre a época, e na verdade a maioria dos processos que se iniciam no início da infância nunca está completamente estabelecido e continuam a ser reforçados pelo crescimento que continua posteriormente na infância e através da vida adulta, até mesmo na velhice (1983 [1963], p.71).

A elaboração da capacidade para o concernimento é longa e é o fundamento para a capacidade de brincar e, posteriormente, trabalhar.
Em seu texto de 1963, Winnicott esclarece:

Preocupação indica o fato do indivíduo se importar, ou valorizar, e tanto sentir como aceitar responsabilidade. Em nível genital no enunciado da teoria do desenvolvimento, preocupação pode ser considerada a base da família, cujos membros unidos na cópula – além de seu prazer – assumem responsabilidade pelo resultado. Mas na vida imaginária total do indivíduo, o tema da preocupação levanta até questão mais ampla, e a capacidade de se preocupar está na base de todo brinquedo e trabalho construtivo. Pertence ao viver normal, sadio, e merece a atenção do psicanalista.

sexta-feira, 24 de maio de 2013

INFORMAÇÃO IMPORTANTE .....






Consulta pública para proposta de Plano Nacional de Atendimento Socioeducativo

A Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR) abriu no dia 13 de maio o prazo para consulta pública para a proposta de Plano Nacional de Atendimento Socioeducativo – SINASE - 2013-2022. As sugestões poderão ser encaminhadas até o 30º dia após a publicação deste despacho, à SDH/PR, por meio do correio eletrônico: consulta.sinase@sdh.gov.br.

Também será permitido o envio de sugestões por escrito, durante o prazo de consulta, para o seguinte endereço: Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Setor Comercial, Quadra 9, Lote C, Edifício Parque Cidade Corporate, Torre "A", 8º andar, Brasília-DF, CEP: 70308-200, com a indicação “Sugestão ao Plano Nacional de Atendimento Socioeducativo - 2013-2022”.

Após a conclusão da consulta pública, a Secretaria de Direitos Humanos promoverá a análise das contribuições e, ao final, publicará o resultado da consulta pública no endereço da Internet: www.direitoshumanos.gov.br.

Fonte: ASCOM SDH/PR

Conselho Nacional de Assistência Social
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quinta-feira, 23 de maio de 2013

DIREITOS ASSEGURADOS AOS ADOLESCENTES...




O modelo anterior de atendimento ao adolescente passou a pertencer a um contexto histórico ultrapassado: a de não asseguração dos direitos fundamentais, um modelo de contenção que se esgotou. A sociedade clamava por mudanças e, a partir disso, instaura-se uma crise. A esse respeito Costa (2006, p. 13) esclarece:

[...] na área do direito da criança e do adolescente [...] as coisas acontecem da mesma forma. A crise ou esgotamento de um modelo de compreensão e ação vem dar lugar a outro. A transição, porém, entre o velho e o novo frequentemente não se dá de maneira específica. Os defensores da velha ordem costumam reagir de todas as formas ao seu alcance para impedir o novo paradigma de se afirmar, de ser hegemônico, de vigorar de modo pleno.

Nesta vertente, a partir de uma mobilização social, nacional, origina-se o Fórum Nacional de Entidades Não-Governamentais de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (Fórum DCA). Esse movimento recolheu mais de seis milhões de assinaturas pedindo a criação de um artigo que estabelecesse os direitos humanos de meninos e meninas na Carta Magna de 1988. Nasce o Artigo 227 da Constituição da República Federativa do Brasil de 05 de outubro de 1998, base para o Artigo 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente:

É dever da família, da sociedade e do Estado, assegurar a criança e o adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-la a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência e opressão.

O processo de redemocratização do Brasil culmina na promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) Lei 8.069 de 1990. O Estatuto é considerado documento de direitos humanos concebido a partir do debate de ideias e participação de vários segmentos sociais envolvidos com a causa da infância no país, ou seja, instituições ligadas pela Igreja Católica e pela sociedade civil, a saber: República dos Emaús – Belém/PA, Pastoral do Menor – São Paulo/SP.
e, o Projeto Nacional de Alternativas e Atendimentos Comunitários a Meninos e Meninas de Rua.

O ECA não é resultado da vontade pessoal das autoridades brasileiras, mas o anseio do conjunto das instituições que sempre fizeram os movimentos sociais em defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes e que controverteram a ordem na luta pela garantia dos direitos das crianças e dos adolescentes em consequência da falta de políticas que viessem atender de fato os meninos e meninas de rua.
Desta forma, o Estatuto representa um marco histórico para a infância e adolescência brasileiras, ao substituir a lógica da Situação Irregular, presente nos antigos Códigos de Menores, pela Doutrina da Proteção Integral.

A Constituição Federal de 1988 prevê a garantia de uma universalidade de direitos às crianças e adolescentes, reforçado no artigo 4º do ECA:
a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias; b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou nos serviços públicos ou de relevância pública; c) preferência na formulação e execução das políticas públicas; d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção da infância e juventude (ECA, 1990, p. 3).
Segundo Guará (2000, p.84, grifos da autora), na década de 1990 nasce um novo pensamento na sociedade:


Uma nova consciência sobre a necessidade de uma política social para a infância e juventude. O termo menor foi enfaticamente substituído por criança e adolescente, com o forte argumento de que era preciso superar o estigma associado ao termo que já se instalara no imaginário social como sinônimo de pobre.

A grande mudança representada pelo ECA é a divisão de responsabilidades: não basta acusar o menor, mas entender o papel da família, do Estado e da sociedade, a fim de garantir direitos integrais às crianças e adolescentes. Hoje, na situação de Garantia de Direitos, o paradigma que permeia a atuação é entender a criança e o adolescente como sujeitos de direitos.

Para a implementação da Doutrina da Proteção Integral o Estatuto prevê um conjunto articulado de ações por parte do Estado e da sociedade. Estas podem ser divididas em quatro grandes linhas:

a) Políticas Sociais Básicas, que, na perspectiva da universalidade, da continuidade e da gratuidade, implicam na garantia dos direitos sociais para todos como dever do Estado; b) Políticas de Assistência Social, prevista para os que se encontram em estado de necessidade temporária ou permanente; c) Políticas de Proteção Especial, para quem se encontra violado ou ameaçado de violação em sua integridade física, psicológica e moral; e d) Políticas de Garantia de Direitos, para as situações nas quais a criança ou o adolescente se encontra envolvido num conflito de natureza jurídica, sendo necessário, para a sua proteção integral, o acionamento das políticas de direito e do órgão do Ministério Público, com observância do devido processo legal.


O ECA estabelece medidas de proteção voltadas para situações em que os direitos de meninos e meninas são ameaçados ou violados, seja por ação ou omissão da sociedade ou do Estado, seja por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsáveis. Define, também, as medidas socioeducativas não privativas de liberdade: Advertência (Art. 115); Obrigação de Reparar o Dano (Art. 116); Prestação de Serviços à Comunidade (Art. 117) e Liberdade Assistida (Art. 118 e 119). As medidas socioeducativas privativas de liberdade em meio aberto ou fechado são aplicadas de acordo com a gravidade do delito cometido pelo adolescente: semiliberdade (art. 120) ou internação em estabelecimento socioeducativo (art. 123 a 125 do ECA).


O SINASE enquanto Lei Federal 12.594/2012 trata da implementação do atendimento das medidas socioeducativas previstas no ECA. A Lei Federal, recentemente promulgada, reafirma o paradigma da proteção integral expressa no Estatuto e institui procedimentos e parâmetros sobre a natureza eminentemente pedagógica da medida socioeducativa, visando trazer avanços para a efetivação de uma política que priorize os direitos humanos.

A implementação do SINASE objetiva primordialmente o desenvolvimento de uma ação socioeducativa sustentada nos princípios dos direitos humanos. Defende, ainda, a idéia dos alinhamentos conceitual, estratégico e operacional, estruturada, principalmente, em bases éticas e pedagógicas. (SINASE, 2012, p.16).

Ao enumerar direitos, estabelecer princípios e diretrizes da política de atendimento, definir competências e atribuições e dispor sobre os procedimentos judiciais que envolvem crianças e adolescentes, a Constituição Federal e o ECA instalaram um Sistema de Garantia de Direitos – SGD (SINASE, 2006).

Surge uma proposta de atendimento socioeducativo nas instituições responsáveis pela execução de medidas. O grande objetivo é a mudança de paradigma na atenção aos adolescentes, para que saiam do lugar social no qual confluem as práticas de exclusão, para um lugar social inclusivo de exercício pleno da sua cidadania.

Na esteira das mudanças, o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA) e o Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), divulgaram juntos um documento denominado Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária (PNCFC) . Esse Plano visa a formulação e implementação de políticas públicas que possam assegurar a garantia das crianças e adolescentes à convivência familiar e comunitária, de forma integrada e articulada com os demais programas de governo.

O Plano visa romper com a cultura da institucionalização de crianças e adolescentes e fortalecer o paradigma da proteção integral e da preservação dos vínculos familiares e comunitários preconizados pelo ECA. As estratégias, objetivos e diretrizes do Plano estão fundamentados, primordialmente, na prevenção ao rompimento dos vínculos familiares, na qualificação do atendimento dos serviços de acolhimento familiar e institucional, quando forem necessários, e, sobretudo, no investimento para o retorno da criança e do adolescente ao convívio com sua família. O consenso a respeito é entender a família como locus privilegiado para o adequado desenvolvimento humano (PNCFC, 2006).



segunda-feira, 13 de maio de 2013

Maioridade Penal: Comoção Popular ou Solução?

“(...) mais do que um ser no mundo, o ser humano se tornou uma Presença no mundo, com o mundo e com os outros.”
(Freire, P. Pedagogia da Autonomia, 1996, p. 18)


Os atos infracionais praticados por adolescentes é questão que mobiliza e angustia a sociedade contemporânea. A mídia propaga casos extremos de expressão da violência praticada pelos jovens gerando um sentimento de revolta, perplexidade e impotência. Tais reportagens são exploradas por mídia impressa e eletrônica sensacionalistas, de nível duvidoso que defendem ideias que se aproximam de um pensamento que esses seres humanos são destituídos de qualquer possibilidade e direito de ressignificar a própria vida, escolher outros caminhos enfim, retomar sua vida social e familiar.

A punição a um ato infracional tem como pressuposto fundamental a cultura social de coerção, ação cristalizada, não oferecendo assim ao adolescente um ponto de partida para que ele avance na leitura do mundo, compreendendo-se como sujeito da história.

Faz-se necessário uma efetiva contribuição dos cidadãos para a formação de uma sociedade democrática. Ao construir um projeto educacional democrático e libertador, lutando pela superação da opressão e desigualdades sociais, visando à transformação social e construção de uma sociedade justa, democrática e igualitária.

O cidadão que tem acesso ao saber, a cultura, moradia e trabalho, às políticas sociais básicas, precisa exercer a prática da consciência crítica por meio da consciência histórica. Tem como obrigação, por integrar uma camada social privilegiada, ensinar a pensar certo, como dizia o mestre Paulo Freire, produzir condições para a aprendizagem crítica. Antes de qualquer coisa é preciso reconhecer o adolescente enquanto indivíduo inserido num contexto social.

É primordial o compromisso do cidadão, que clama por justiça penal para o adolescente, o desenvolvimento de um entendimento cultural, uma consciência social crítica que contemple um esforço para a efetivação de ações políticas, mobilizações sociais, formação de uma equipe de trabalho, ou seja, só assim podemos pensar na superação de uma realidade na qual o adolescente é vítima de um total descaso social e vitimizador.

O cidadão que clama por justiça, respeito e segurança – e com muita razão – deve ter a serenidade e sabedoria para usar bem suas palavras, ponderar antes de agir e julgar à revelia. As redes sociais hoje se constituem em arma poderosa e muitas opiniões são formadas advindas de textos que expressam total desinformação e escritos sob emoção. Assim, falta a compreensão das causas do caos social e do comprometimento ético do papel social de cada indivíduo.

A clareza política minimiza a discriminação e humaniza as relações. O adolescente que tem acesso às Política Públicas, é legitimado pela sociedade, sai do lugar de invisibilidade social para ter a oportunidade de se ressignificar como ser humano e transformar seu contexto social e histórico.


É necessário assumir-se como ser social e histórico como ser pensante, comunicante, transformador, criador, realizador de sonhos. Tomar decisões baseadas em comoção é questionável...precisamos rever nosso lugar social.