domingo, 6 de novembro de 2011

O adolescente autor de ato infracional: contexto sócio-histórico, moral e cultural

Minha especialização em teoria psicanalítica e o mestrado em psicologia clínica tiveram, como objeto de pesquisa, o adolescente infrator, tema que mobiliza e provoca inquietações. Na dissertação pesquisei a teoria winnicottiana do amadurecimento do ser humano e sua aplicabilidade na prática institucional por meio da sistematização de um modelo de atendimento socioeducativo aos adolescentes em cumprimento da medida de privação de liberdade.
O adolescente autor de ato infracional é problema de grande mobilização social. No percurso deste jovem muitas vezes prevalece a invisibilidade e o não-reconhecimento social. A expressão da destrutividade e da violência tornam-se uma forma encontrada pelos adolescentes de “sobreviverem” enquanto sujeitos massificados pelo descaso social.
O psicanalista inglês Donald Woods Winnicott é considerado inovador nas pesquisas sobre adolescência e delinquência . Os estudos da sua obra provocou reflexões e inquietações sobre as especificidades da ações desenvolvidas junto ao jovem. O autor problematiza dois aspectos fundamentais para o estudo do processo adolescente, assim como para a compreensão da delinquência: o primeiro é quando ressalta a importância de uma análise cuidadosa do contexto histórico-social em que o adolescente está inserido e o segundo é o espaço relevante que atribui ao ambiente familiar, que, a seu ver, deve ser suficientemente bom e humano para possibilitar ao bebê um processo contínuo de desenvolvimento emocional.
O autor enfatiza, nos seus escritos, a necessidade da compreensão do adolescente como sujeito de direitos destacando a importância do respeito aos direitos humanos na atenção integral ao jovem com tendência antissocial:

Hoje, como sempre, a questão prática é como manter um ambiente que seja suficientemente humano, e suficientemente forte, para conter os que prestam assistência e os destituídos e delinqüentes que necessitam desesperadamente de cuidados e pertencimento, mas fazem o possível para destruí-los quando o encontram. (1983, p. XVI)

O adolescente que comete um ato infracional pode ter vivenciado a experiência de “não ser visto”, talvez não legitimado na condição de sujeito de direitos sociais básicos. A omissão do Estado, a “invisibilidade” social, o reconhecimento controvertido das instituições, o problema da humilhação social, a violência familiar, pais e filhos numa relação de agressão mútua, uma trama de privações, abandonos ou verdadeiras e privações materiais e afetivas podem levar o jovem a pensar na violência como forma de “marcar” um espaço social.
Nesse contexto de sofrimento, o adolescente sai de casa, fugindo das situações de riscos intrafamiliares. Essa saída, na sua fantasia, é uma possibilidade de romper com o processo de coisificação imposto, tornando-se sujeito de sua própria história por meio de um empoderamento que as ruas conferem. Entretanto, o adolescente encontra nas estruturas urbanas e no grupo marginal outras situações de riscos e isolamento que comprometem seu desenvolvimento, mas, que são vistas como sua única possibilidade de pertença.
O grupo delinquente exige, dos adolescentes e jovens, adesão incondicional o que implica participação coletiva nos ato de furtar, roubar, matar, sequestrar, traficar. O vínculo que se estabelece produz um segredo e cultura comum. A transgressão coletiva pode solidificar o grupo, estabelecer sentimento de pertença e garantir reconhecimento mútuo. Nessa organização o líder exerce o poder, talvez reproduzindo as relações sociais.
É relevante pensar que a diferença na posição social do sujeito pode influenciar, significativamente, na estruturação de sua adolescência. As desigualdades sociais dificultam o processo da adolescência do jovem de classe menos favorecida, pois ele se ocupa de questões básicas de sobrevivência. Os jovens ficam à deriva, não há como desenvolver o sentido da própria identidade, ou seja, não há espaço para sua construção enquanto sujeitos, se é negado o acesso à educação, saúde e respeito.
As pesquisas desenvolvidas sobre o adolescente e delinquência devem ser ampliadas na perspectiva da teoria crítica considerando a psicanálise de Winnicott sobre o processo de amadurecimento emocional do ser humano e o pensamento e Axel Honneth.
No exercício das minhas atribuições profissionais e nos meus estudos transitei por questões essencialistas que perpassam a vida do ser humano como ser inserido num contexto sócio histórico, moral e cultural.

domingo, 31 de julho de 2011

Estágio do concernimento

[...] eu me preocupo muito com o desenvolvimento da capacidade para a preocupação (Concern).
Winnicott (1948)

Winnicott (1963) formula sua compreensão acerca do estágio do concernimento, frisando “ser uma condição para a conquista do concernimento a passagem pelos estágios iniciais sem demasiados problemas” (Moraes, 2005, p. 220, grifo da autora). Entendemos que é importante ressaltar esta introdução ao estudo deste estágio realizada pelo autor:

Estamos examinando a psicologia do estágio que acontece imediatamente depois do novo ser humano ter alcançado o status de unidade [...] Gostaria de deixar aqui a observação de que quanto mais recuarmos na história individual, mais verdadeira se torna a proposição segundo a qual não há sentido em falarmos sobre o indivíduo sem considerarmos um ambiente suficientemente bom que se adapte às suas necessidades (2000 [1954-5, p. 360].).

A capacidade para o concernimento resulta de um cuidado suficientemente bom e seu desenvolvimento está ligado à saúde psíquica. No desenvolvimento emocional certas condições externas são necessárias para o amadurecimento pessoal. Como Winnicott diz:

A provisão ambiental continua a ser vitalmente importante aqui, embora o lactente esteja sendo capaz de possuir uma estabilidade interna que faz parte do desenvolvimento da independência (1983 [1963], p.72).


Assim, mediante estes cuidados, o bebê alcança, em algum grau, o estatuto de um EU unitário como também já pode realizar a tarefa de integração da vida instintual. Estes seriam os pré-requisitos para a entrada no estágio do concernimento.
O bebê aqui já se percebe como uma unidade e à mãe como pessoa separada, inicia a integração da instintualidade como parte do seu eu. A criança percebe que ama e odeia o mundo fora dela e a realidade de que possui impulsos amorosos e destrutivos para com o mesmo objeto. Desta forma, se vê concernida pelo amor e pelo ódio, Winnicott é enfático ao afirmar que só a sustentação ambiental permite esta relação.
Portanto, o concernimento (Concern), considerado por Winnicott como uma experiência que demanda certo desenvolvimento emocional, surge com a integração da mãe-ambiente e mãe-objeto na mente do bebê. É neste estágio que ocorrem alterações importantes no mundo interno da criança em função do seu amadurecimento pessoal.
Para ele, o termo concernimento é utilizado para dar conta, de um modo positivo, do fenômeno que é abarcado negativamente pela palavra ‘culpa’. O concernimento implica uma maior integração e relaciona-se a um sentimento de responsabilidade, refere-se ao fato de que o indivíduo se importa ou se preocupa, aceitando a sua responsabilidade.
O autor diz que nesta fase a relação é eminentemente dual, mas, embora tente situar a época em que o momento ocorre, acredita que não existe uma precisão absoluta uma vez que o amadurecimento do ser humano acontece ao longo da vida:

Há uma boa razão para se acreditar que preocupação – com seu aspecto positivo – emerge no desenvolvimento emocional inicial da criança em um período anterior ao do clássico complexo de Édipo, que envolve um relacionamento a três pessoas, cada uma sendo percebida como uma pessoa completa pela criança. Mas não há necessidade de ser preciso sobre a época, e na verdade a maioria dos processos que se iniciam no início da infância nunca está completamente estabelecido e continuam a ser reforçados pelo crescimento que continua posteriormente na infância e através da vida adulta, até mesmo na velhice (1983 [1963], p.71).

A elaboração da capacidade para o concernimento é longa e é o fundamento para a capacidade de brincar e, posteriormente, trabalhar. Em seu texto de 1963, Winnicott esclarece:

Preocupação indica o fato do indivíduo se importar, ou valorizar, e tanto sentir como aceitar responsabilidade. Em nível genital no enunciado da teoria do desenvolvimento, preocupação pode ser considerada a base da família, cujos membros unidos na cópula – além de seu prazer – assumem responsabilidade pelo resultado. Mas na vida imaginária total do indivíduo, o tema da preocupação levanta até questão mais ampla, e a capacidade de se preocupar está na base de todo brinquedo e trabalho construtivo. Pertence ao viver normal, sadio, e merece a atenção do psicanalista.

*Parte de capítulo da minha dissertação de mestrado.

domingo, 17 de julho de 2011

Pessoal
Sou membro de um grupo aberto DEM-CAP Prevenção às Drogas criado por Paulo Carvalho do Rio de Janeiro.
Acho importante participarmos dessa luta.
Segue o endereço:

prevencaoasdrogas@groups.facebook.com

Estou pesquisando e em breve pretendo postar sobre o tema.
Cláudia

FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA E VULNERABILIDADE SOCIAL


Nos últimos 20 anos, várias mudanças no plano socioeconômico-culturais, pautadas no processo de globalização da economia capitalista, interferem na dinâmica e estrutura familiar possibilitando alterações em seu padrão tradicional de organização

A definição de família depende do contexto socio-cultural em que está inserida. Em nossa cultura é compreendida como um grupo de indivíduos ligados por laços de sangue que habitam a mesma casa, entretanto, não se define só pelos laços biológicos, mas pelos significantes que criam elos de sentido das relações sem os quais essas relações se esfacelam. É um grupo social composto de indivíduos que se relacionam cotidianamente gerando uma gama de emoções.

É o espaço indispensável para a garantia da sobrevivência e da proteção integral dos filhos e demais membros, independentemente do arranjo familiar ou da forma como vêm se estruturando. É a família que propicia os aportes afetivos e materiais necessários ao desenvolvimento e bem-estar para isso os pais ou substitutos tem a tarefa de garantir um ambiente estável e confiável; adaptação às necessidades da criança proporcionando desenvolvimento emocional saudável.

O “Sentimento de Família” se forma a partir de um emaranhado de emoções e ações pessoais, familiares e culturais, compondo o universo do mundo familiar. Esse universo é único para cada família, mas circula na sociedade nas interações com o meio social em que vivem.

Família pobre contemporânea:

A família desempenha um papel decisivo na educação formal e informal, é um espaço em que são transmitidos valores morais, culturais e éticos e se aprofundam os laços de solidariedade e se constroem as marcas entre as gerações.
A Família não é apenas o elo afetivo mais forte dos pobres, o núcleo da sua sobrevivência material e espiritual, o instrumento através do qual viabilizam seu modo de vida, mas é o próprio substrato de sua identidade social. Sua importância não é funcional, seu valor não é meramente instrumental, mas se refere à sua identidade de ser social e constitui o parâmetro simbólico que estrutura sua explicação do mundo.

Para as famílias pobres, marcadas pela fome e miséria, a casa representa um espaço de privação, de instabilidade e de esgarçamento dos laços afetivos e de solidariedade. A casa deixa de ser um espaço de proteção para ser um espaço de conflito.

A superação desta condição é difícil uma vez que as famílias não dispõem de REDES de APOIO. A realidade das famílias pobres impede/dificulta o desenvolvimento saudável dos seus membros uma vez que não tem acesso a ações sustentadas nos princípios dos direitos humanos.

A proteção integral à criança e ao adolescente, garantida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente - artigo 4º - dispõe sobre a co-responsabilidade da família, sociedade e Poder Público.

A injustiça social exclui a família desse processo, pois não tem acesso às mínimas condições para cumprir as tarefas básicas de amparo e proteção dos seus membros de forma que eles sejam reconhecidos socialmente.

A situação socioeconomica é o fator que mais tem contribuído para a desestruturação da família repercutindo nos filhos vítimas da injustiça social e violados em seus direitos fundamentais, favorecendo o desequilíbrio das relações e a desagregação familiar.

A pobreza, a miséria, a falta de perspectiva de um projeto social que vislumbre a melhoria da qualidade de vida, impõe a toda a família uma luta desigual e desumana pela sobrevivência.

As conseqüências a que está sujeita a família pobre precipitam a ida de seus filhos para as ruas e, na maioria das vezes, o abandono da escola, a fim de ajudar no orçamento familiar.

Essa situação, inicialmente temporária, pode se estabelecer à medida que as articulações na rua vão se fortalecendo…. Assim, o retorno ao convívio familiar fica cada vez mais distante….

Percebe-se que para essas famílias, a perda ou rompimento dos vínculos produz sofrimento e leva o indivíduo à descrença de si mesmo. O indivíduo torna-se frágil e com baixa auto-estima.

Esta descrença conduz a incorporação de um sentimento desagregador.

A questão da família pobre aparece como a face mais cruel da disparidade econômica e da desigualdade social. Esse estado de privação de direitos atinge a todos de forma muito profunda, à medida que produz a banalização de sentimentos, dos afetos e dos vínculos.

Gomes & Pereira, 2004.

O ser humano é bastante complexo e contraditório, ambivalente em seus sentimentos e condutas, capaz de construir e de destruir. Em condições sociais de escassez, de privação e de falta de perspectivas, as possibilidades de amar, de construir e de respeitar o outro ficam bastante ameaçadas. Na medida em que a vida à qual está submetido não o trata enquanto homem, suas respostas tendem à rudeza da sua mera defesa da sobrevivência.

(Vicente, 1994)

No que se refere ao discurso sobre famílias pobres, aquelas consideradas vulneráveis, sobre quem incidem as intervenções, pode-se dizer que há duas vertentes básicas que fundamentam estas ações:

A primeira pode ser chamada de visão instrumental da família, que a reduz a um grupo articulador de “estratégias de sobrevivência”, pensando-a como unidade de consumo e geração de renda. Esta vertente desconsidera que mesmo vivendo em condições materiais muito precárias não se é movido apenas por exigências de sobrevivência. É desejo de todos os homens e mulheres compreender e dar sentido ao mundo em que se vive. (Sarti, 1999)

“Qualquer comunidade humana traz consigo, à sua maneira, a indagação sobre a própria existência”. A segunda vertente argumenta em favor da intervenção em famílias, a partir de uma concepção de famílias consideradas como fonte de problemas sociais (necessidade de “intervir”).

Neste discurso, ignora-se os determinantes sociais, exteriores à família, nega-se a possibilidade que a família tenha recursos próprios e potencialidade para mudar suas condições. (Sarti, 1999)

sábado, 4 de junho de 2011

Resiliência

Uma colega de estudos na USP encaminhou, por e-mail, uma reflexão sobre resiliência que compartilho com vocês:

"Quando falo de resiliência algumas vezes costumo ilustrar com o exemplo do bambu, que atingem alturas altíssimas, porém são finos e estão sempre em conjunto com outros galhos, ao bater a ventania temos a nítida impressão de que vão cair e/ou quebrar, mas nos surpreendem dançando ao vento e voltando a reerguer-se majestosamente na natureza ainda nos oferecendo sombra e segurança".

Adriana Meneghetti


domingo, 22 de maio de 2011

O PAPEL DO ESPELHO NO ROSTO DA MÃE

O elemento diferencial da teoria de Winnicott é o entendimento de que os acontecimentos dos estágios pré-primitivos constituem-se nos alicerces da personalidade saudável. Considera o meio essencial para o desenvolvimento emocional, para o autor, ao se falar da criança “deve-se mencionar dependência e natureza do ambiente”. (1959-64 p. 117)

A tese de Winnicott é a de que na primeira fase a mãe vivencia um estado psicológico (desde a gravidez) ao qual denominou preocupação materna primária, condição que lhe possibilita a adaptação sensível às necessidades do seu bebê. Como descreve no seu artigo de 1956 (2000, p. 403):

A mãe que desenvolve esse estado ao qual chamei de ‘preocupação materna primária’ fornece um contexto para que a constituição da criança comece a se manifestar, para que tendências ao desenvolvimento comecem a desdobrar-se, e para que o bebê comece a experimentar movimentos espontâneos e se torne dono das sensações correspondentes a essa etapa inicial da vida.

Grande parte do amadurecimento inicial se dá a partir da relação bebê/mãe. O bebê precisa que a mãe se adapte às necessidades dele mas, para Winnicott, é preciso permitir que a integração ocorra a partir de um impulso do bebê – garantindo assim sua pessoalidade. Se o ambiente se antecipa ao bebê sistematicamente, ou seja, tornando-se padrão, a mãe submete o bebê a um tempo externo - padrão de submissão.

Winnicott enfatiza a importância do ambiente saudável que acolha o gesto do bebê em direção à vida. Se o bebê não se desenvolver a partir de sua própria criatividade originária ele pode reagir, perde a espontaneidade (espontaneidade X reatividade). De certa forma, no decorrer do seu processo de amadurecimento, apesar da falha ambiental, o indivíduo pode até mobilizar a mente e estabelecer uma integração defensiva - o falso si-mesmo - que irá permitir uma relação adaptada com o meio. A esse respeito Dias (2007) esclarece:

Apesar de o processo de amadurecimento não ser linear, algumas conquistas têm pré-requisitos [...] Ou seja, a resolução satisfatória das tarefas de cada estágio depende de ter havido sucesso na resolução dos estágios anteriores. Se ocorre fracasso na resolução da tarefa de uma certa etapa, novas tarefas vão surgindo, mas o indivíduo, não tendo feito a aquisição anterior, carece da maturidade [...] ele pode até resolvê-las, mobilizando a mente e/ou uma integração defensiva do tipo falso si-mesmo, mas, apoiadas em bases falsas, elas não farão parte intrínseca do seu si-mesmo como aquisições pessoais.

A mãe viva, que presta todos os cuidados, possibilita a constituição da temporalidade e da previsibilidade. O ser humano necessita de asseguramento, espaço, tempo e sentido de permanência para a continuidade de ser. Quando o bebê não alcança este encontro global, por meio desses cuidados regulares e previsíveis, fica em estado de alerta. Ocorrendo sucessivas descontinuidades o bebê não consegue mais ir para o estado tranqüilo, podendo desenvolver a organização de defesas primitivas e a doença psicótica.

Winnicott (1983 [1959-1964] p. 114) compreende que “a psicose se origina num estágio em que o ser humano imaturo é inteiramente dependente do que o meio lhe propicia.” A psicose, portanto, é produzida por deficiência ambiental no estágio de dependência absoluta.” A doença é secundária à falha do ambiente “embora se revele clinicamente como um distorção mais ou menos permanente da personalidade do indivíduo.” (Winnicott [1959-64] p. 126).

O desenvolvimento inicial depende de um suprimento ambiental satisfatório, e, segundo Winnicott (1999, p. 4), “ambiente satisfatório é aquele que facilita as várias tendências individuais herdadas [...] com um alto grau de adaptação às necessidades individuais da criança”. No artigo O papel de espelho da mãe e da família no desenvolvimento infantil (1967) o autor ressalta

É, portanto, essencial, a adaptação materna suficientemente boa às necessidades do bebê; a constituição do si-mesmo só existe enquanto tal frente a esse ambiente que sustenta, saudável, que acolha o gesto do bebê em direção à vida. Para Winnicott (1983 [1963] p. 215) ambiente suficientemente bom significa que existe a mãe que está “[...] de início totalmente devotada aos cuidados do bebê, e aos poucos, se reafirma como uma pessoa independente”.

No desenvolvimento emocional individual, diz Winnicott que “o precursor do espelho é o rosto da mãe” (1975, p.153) descreve a função ambiental como o segurar, o manejar e apresentar objetos para o bebê. O bebê vê a si mesmo quando olha para o rosto da mãe...

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DIAS, E. O A Teoria do Amadurecimento de D. W. Winnicott. Rio de Janeiro, Imago, 2003.

GARCIA, R.M. A Tendência Anti-Social em D. W. Winnicott. Dissertação de mestrado em Psicologia Clínica. PUC/SP, 2004.

MORAES, A. A. R. E. A Contribuição Winnicottiana para a Teoria e Clínica da Depressão. Doutorado em Psicologia Clínica. PUC/SP, 2005.

NAFFAH, A. A noção de experiência no pensamento de Winnicott como conceito diferencial na história da psicanálise. Artigo não publicado, ago.2007.

WINNICOTT, C. & SHEPHERD, R. & DAVIS, M. (Orgs) Explorações Psicanalíticas: D. W. Winnicott. Porto Alegre, Artes Médicas, 1994.

WINNICOTT, D. W. O Ambiente e os Processos de Maturação. Porto Alegre, Artmed, 1983.

______ Pensando sobre Crianças. Porto Alegre, Artmed, 2005.

______ Natureza Humana. Rio de Janeiro, Imago, 1990.

______ 1971: O Brincar e a Realidade. Rio de Janeiro, Imago, 1975.

______ Privação e Delinquência. São Paulo, Martins Fontes, 1999.

______ Da Pediatria à Psicanálise: Obras Escolhidas. Rio de Janeiro, Imago, 2000.

domingo, 27 de fevereiro de 2011

RESILIÊNCIA

Apesar de vivermos em plena consolidação da democracia numa época em que os direitos garantidos são pela Constituição Federal de 1988, inúmeras violações dos direitos humanos revelam práticas arbitrárias que enfraquecem as tentativas de abrir caminhos para a efetivação da política da proteção integral aos idosos, famílias, jovens. O enfrentamento das situações de falta de acesso às políticas públicas, a uma rede socioassistencial conduz a um quadro de miserabilidade, desnível social, gerando um sentimento de impotência e extremo sentimento de “viver à margem”. A miséria, a violência envolvendo jovens é objeto de análise e reflexão em inúmeros debates, buscando-se alternativas embasadas nos direitos humanos. Segundo Walsh (2005, p. 4) resiliência pode ser definida como a capacidade de renascer da adversidade fortalecido e com mais recursos. È um processo ativo de resistência, reestruturação e crescimento em resposta à crise e ao desafio A compreensão da resiliência é ampla, não se trata simplesmente de sobreviver a uma crise e sim como enfrentar e sair da situação. As qualidades da resiliência para Walsh implicam nas pessoas conseguirem se mobilizar escolhendo opções viáveis, superando crises importantes assumindo suas vidas indo em frente para viver e amar plenamente (2005, p.4). Durante um período de crise cada família possui sua especificidade no enfrentamento. Algumas famílias ficam abaladas e paralisadas ante as dificuldades, não conseguem buscar caminhos nem opções viáveis. Outras, entretanto, desenvolvem uma união e se fortalecem no sofrimento. Podemos pensar que um padrão transgeracional de enfretamento de situações difíceis está implícito na forma como cada família supera ou paralisa perante às adversidades. Podemos entender que a família pode ser uma fonte potencial de resiliência, um recurso para ajudar os seus membros a superarem uma crise ou se apoiarem mutuamente numa interação saudável num momento de crise que envolve a todos. Faz-se necessário entender os processos que estimulam a resiliência familiar, a solidez da relação.Walsh, Froma (2005, p. 03) esclarece que a abordagem da Resiliência Familiar (…) visa identificar e fortalecer processos fundamentais que permitem às famílias resistir aos desafios desorganizadores da vida e renascer a partir deles. Os objetivos da abordagem da resiliência: prevenção, intervenção clínica e pesquisa. A comunicação é essencial para a resiliência familiar nos processos de perdas. Cada membro reage à sua maneira dependendo de diversas variantes como idade, posição na família, personalidade, etc.

A capacidade de aceitar a perda está no cerne de todas as habilidades e está presente nos sistemas familiares saudáveis. Observamos, no entanto, famílias com padrões pouco adaptativos para lidar com perdas inevitáveis pois, a capacidade de aceitar a perda e mudança implica na aceitação da idéia da morte e compartilhar tristeza e receber conforto na rede de apoio. Nossa cultura dificulta o reconhecimento da nossa própria fragilidade e em pedir ajuda. Assim, os grupos sejam os sociais,ou religiosos são fundamentais e facilitadores na superação da crise.

Em meio aos tumultos sociais e econômicos das últimas décadas, as famílias estão lidando com muitas perdas, desorganizações e incertezas. Ajudando as famílias a lidar com suas perdas, nós as capacitamos a transformar e melhorar os relacionamentos enquanto desenvolvem novos potenciais para enfrentar os futuros desafios da vida.

Resiliência na doença e prestação de cuidados:

Com relação ao enfrentamento e resiliência na doença, Walsh (2005, p. 197) considera:

A doença grave pode ser experimentada como um despertar para a vida. Ela pode aumentar e alterar nossa percepção das prioridades, com freqüência perdidas nas exigências confusas da vida cotidiana. Pode nos obrigar a fazer mudanças em nossos padrões de vida, assim como em nossas esperanças e sonhos. As doenças físicas ou mentais graves impõem uma série de desafios para os casais e para as famílias, requerendo uma considerável resiliência para seu enfrentamento e adaptação.

Frente a uma situação de doença grave na família esta se defronta com um grande desafio, os membros da família, repentinamente, se vêem como cuidadores. Esta tarefa implica em possuir as qualidades de resiliência uma vez que os cuidadores, mesmo com a rede de apoio, vão vivenciar e testemunhar o adoecimento e o desenrola de um processo, muitas vezes doloroso, de seu ente querido até a morte. O envolvimento da família no tratamento é facilitado quando ela recebe o respeito e apoio comunitário.