
Estágio do Concernimento
[...] eu me preocupo muito com o desenvolvimento da capacidade de preocupação (Concern).
Winnicott (1948)
Winnicott (1963) formula sua compreensão acerca do estágio do concernimento, frisando “ser uma condição para a conquista do concernimento a passagem pelos estágios iniciais sem demasiados problemas” (Moraes, 2005, p. 220, grifo da autora).
Entendemos que é importante ressaltar esta introdução ao estudo deste estágio realizada pelo autor:
Estamos examinando a psicologia do estágio que acontece imediatamente depois do novo ser humano ter alcançado o status de unidade [...] Gostaria de deixar aqui a observação de que quanto mais recuarmos na história individual, mais verdadeira se torna a proposição segundo a qual não há sentido em falarmos sobre o indivíduo sem considerarmos um ambiente suficientemente bom que se adapte às suas necessidades (2000 [1954-5, p. 360].).
A capacidade para o concernimento resulta de um cuidado suficientemente bom e seu desenvolvimento está ligado à saúde psíquica. No desenvolvimento emocional certas condições externas são necessárias para o amadurecimento pessoal. Como Winnicott diz:
A provisão ambiental continua a ser vitalmente importante aqui, embora o lactente esteja sendo capaz de possuir uma estabilidade interna que faz parte do desenvolvimento da independência (1983 [1963], p.72).
Assim, mediante estes cuidados, o bebê alcança, em algum grau, o estatuto de um EU unitário como também já pode realizar a tarefa de integração da vida instintual. Estes seriam os pré-requisitos para a entrada no estágio do concernimento.
O bebê aqui já se percebe como uma unidade e à mãe como pessoa separada, inicia a integração da instintualidade como parte do seu eu. A criança percebe que ama e odeia o mundo fora dela e a realidade de que possui impulsos amorosos e destrutivos para com o mesmo objeto. Desta forma, se vê concernida pelo amor e pelo ódio, Winnicott é enfático ao afirmar que só a sustentação ambiental permite esta relação.
Portanto, o concernimento (Concern), considerado por Winnicott como uma experiência que demanda certo desenvolvimento emocional, surge com a integração da mãe-ambiente e mãe-objeto na mente do bebê. É neste estágio que ocorrem alterações importantes no mundo interno da criança em função do seu amadurecimento pessoal.
Para ele, o termo concernimento é utilizado para dar conta, de um modo positivo, do fenômeno que é abarcado negativamente pela palavra ‘culpa’. O concernimento implica uma maior integração e relaciona-se a um sentimento de responsabilidade, refere-se ao fato de que o indivíduo se importa ou se preocupa, aceitando a sua responsabilidade.
O autor diz que nesta fase a relação é eminentemente dual, mas, embora tente situar a época em que o momento ocorre, acredita que não existe uma precisão absoluta uma vez que o amadurecimento do ser humano acontece ao longo da vida:
Há uma boa razão para se acreditar que preocupação – com seu aspecto positivo – emerge no desenvolvimento emocional inicial da criança em um período anterior ao do clássico complexo de Édipo, que envolve um relacionamento a três pessoas, cada uma sendo percebida como uma pessoa completa pela criança. Mas não há necessidade de ser preciso sobre a época, e na verdade a maioria dos processos que se iniciam no início da infância nunca está completamente estabelecido e continuam a ser reforçados pelo crescimento que continua posteriormente na infância e através da vida adulta, até mesmo na velhice (1983 [1963], p.71).
A elaboração da capacidade para o concernimento é longa e é o fundamento para a capacidade de brincar e, posteriormente, trabalhar.
Em seu texto de 1963, Winnicott esclarece:
Preocupação indica o fato do indivíduo se importar, ou valorizar, e tanto sentir como aceitar responsabilidade. Em nível genital no enunciado da teoria do desenvolvimento, preocupação pode ser considerada a base da família, cujos membros unidos na cópula – além de seu prazer – assumem responsabilidade pelo resultado. Mas na vida imaginária total do indivíduo, o tema da preocupação levanta até questão mais ampla, e a capacidade de se preocupar está na base de todo brinquedo e trabalho construtivo. Pertence ao viver normal, sadio, e merece a atenção do psicanalista.